quinta-feira, 14 de maio de 2009

poemas de carlos drumond de andrade


Carlos Drummond de Andrade

Os ombros suportam o mundo


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.


Tempo de absoluta depuração.


Tempo em que não se diz mais: meu amor.


Porque o amor resultou inútil.


E os olhos não choram.

E as mãos tecem apenas o rude trabalho.

E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.

Ficaste sozinho,

a luz apagou-se,

mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.

És todo certeza, já não sabes sofrer.

E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?

Teus ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão

de uma criança.

As guerras, as fomes,

as discussões dentro dos edifícios provam apenas que

a vida prossegue e nem todos se libertaram ainda.

Alguns, achando bárbaro o espetáculo

prefeririam (os delicados) morrer.

Chegou um tempo em que não adianta morrer.

Chegou um tempo que a vida é uma ordem.

A vida apenas, sem mistificação.

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